17 de janeiro de 2019

Ficção | Crónicas das Mulheres Apaixonadas


Quando ele apareceu, eu soube. Imediatamente. Soube que era ele. Que os que existiram foram aprendizagem, experiência, que ele era o agora e o que vem depois.
Ele era amor. Eu sentia-o no fundo do meu ser, nos ossos, na pele, no peito. Fui feita para ele. Nascida, criada, destinada a viver uma vida onde ele estivesse presente também. Como meu.
Nem sei como o soube. Só soube que era assim. Que era na rudeza doce das suas mãos e nas palavras que me falava quando misturávamos os lábios, que eu me perdia e me encontrava.
Era no meio dos braços dele que sabia que o mundo era nosso e que éramos dele. Que ele nos juntou porque o próprio Universo soube que a vida não andaria se não fôssemos um do outro.
Ele veio e mudou tudo. Trouxe o pequeno, o grande, o calmo, o avassalador, trouxe a vida e o amor. Veio sereno, discreto, devagarinho mas eu apaixonei-me depressa, com força e de repente.
E gravou-se e amou-me. E veio. E ficou.

A Autora,
Tua


15 de novembro de 2018

A lei pragmática da teoria do afeto


Nem sei por onde começar. Escrevi isto aqui em vez de te mandar porque metade de mim quer que saibas isto e a outra metade não quer que saibas. Eu não te vou dizer, será fruto do acaso se leres estas palavras, mas preciso urgentemente de tirar isto de dentro de mim.
Eu sou uma pessoa feliz, mesmo nos momentos difíceis. Mas há muito tempo que já não me sentia tão triste e tão magoada. 
Vou contar-te algo sobre mim. Se estiver na beira do precipício e vir pessoas no fundo à minha espera, eu atiro-me. Sempre na esperança, certa e convicta, de que elas me vão apanhar ou de que ao menos me levantam depois de eu cair. É assim que o meu amor funciona. Tanto me atiro, como agarro quem vem.
O mesmo se passou contigo. Vieste de sorriso fácil, com um conselho sábio de “faz assim, porque fazes melhor” e esses olhos azuis tão teus. E eu desconfiei. Sorrisos fáceis, olhos bonitos, são combinações perigosas. Tiveste que esperar dois meses até eu te dar a oportunidade de me mostrares quem eras. E por incrível que pareça durante esses dois meses não nos voltámos a encontrar uma única vez. Há coisas assim.
Foi difícil confiar. Não sei se pela diferença de idades (se bem que gente crescida nunca me assustou), se pela facilidade como largavas a lisonja. Tudo o que é demais deixa-me de pé atrás. Tu já sabes.
Mas eu atirei-me, nem pelo meio tive de esperar, e as coisas mudaram rapidamente. Eu ajustei-me ao que eras, descobri mais do que o que achava que sabia à primeira vista e deixei que visses mais do que aquilo que estava disposta a deixar ver. Ajustámo-nos um ao outro.
Não vivo de princípios de indução, mas um coração pensa em tudo. E logo veio, rápido e frontal, o carinho que hoje sinto por ti. É a lei pragmática da teoria do afeto.
Aprendi muitas coisas à medida que fui crescendo. Fiz caminhos diferentes e apesar de serem anos escassos, foram ricos e abundantes em lições de vida. Pensei com muita força “que isto tinha de durar porque é um amigo assim que preciso na minha vida”.
Mas se há algo que aprendi é que não vale prender as pessoas. Se querem ficar, então fiquem, mas só se for de livre vontade. No fim, quem fica, fica, quem vai, fica no peito. Vai-se da vida, transforma-se em memória e afeto. Mas outra coisa que aprendi, algo que tem que andar sempre de mãos dadas com o que te disse nas linhas anteriores, é que onde há espaço para amor, não há espaço para mágoas.
Das vezes em que havia entre nós palavras menos simpáticas, sentia o peso dessa possibilidade. Do fim da amizade, do reajustar a uma vida que seria novamente diferente.
Eu digo que não gosto de rotinas, mas só vivo por elas. Se um hábito se acaba, tudo muda. Se te fosses, tudo seria diferente. E nem precisavas de deixar de existir fisicamente, bastava que apenas te afastasses da constância dos dias.
Tens defeitos, pormenores de ti que me tiram do sério, palavras que dizes que marcam, mas todos temos. Eu tenho defeitos. Tantos. Mas aceito-te quando vejo os teus. Se fazes o mesmo? Não sei.
Tenho pensado minuto a minuto em nós – nós plural, não nós enquanto um, mas sim um mais um – tenho tentado descobrir porque me sinto tão mal, tão destroçada. Sinto como se todos estes meses te tivesse visto através de uma cortina e agora que ela se levantou, vejo uma pessoa completamente diferente, não o de sempre, mas algo novo que parece distante daquilo que eras para mim. Hei de ficar bem, hei de saber lidar com isto.
Enquanto isso, lembra-te de uma coisa: tudo o que disse está dito, nada do que te disse eu tenho desejo de retirar. Vamos aprendendo com o que vemos nos outros.
És importante.
A Autora,
A outra metade do "bons amigos"


9 de novembro de 2018

Cingulomania.

Isso não funciona bem assim. Não imaginas a quantidade de vezes que já ouvi isto. Não, não vives só do coração. Não, cala-te, não fales sempre com o peito.
Mas sempre vivi de amor. A verdade é essa. Sempre falei com o coração na boca e agora é através dele que te falo. Estou aqui. Nada mais tenho a dizer-te para além disso. Estou aqui.
Por isso, vem. Por favor, atira-te e eu amparo-te a queda. Cuido dos pedaços que se partirem, os do impacto e todos os que se quebraram no resto da vida.
Ao mesmo tempo há o medo de que não queiras nada do meu amor simples e sereno, que não consigas ver que se o chão for esburacado, eu sou quem te mantém os pés no sítio.
Queria que soubesses e que guardasses em ti que mesmo que um dia me peças só a mão, eu vou sempre carregar-te no colo todo. Porque o amor é mesmo isso. É dar tudo quando podíamos apenas dar pouco.
Antes ajudar a carregar o teu peso do que ser leve e ter que voar sozinha. 
A autora,
Aquela Daquele Sítio Ali







10 de outubro de 2018

Dois Quadrados de Chocolate



"Fazes o que eu faço: quando tiveres um pesadelo, comes dois quadrados de chocolate."
Esta é uma das memórias que guardo daquilo que me ias dizendo. Tenho mais, muitas mais, mas com o passar do tempo já não as consigo distinguir. Já não sei se são certas, como esta, ou se são memórias que o meu coração deseja que tenham acontecido. Como se por vontade própria tentasse compensar a tua ausência com a lembrança de momentos bons. O mesmo acontece em relação ao que eras. Já não sei se eras mesmo como eu agora te imagino ou se é a cabeça que baralha o coração, se te fiz melhor, mais todo-o-poderoso do que eras na realidade. Independentemente disso, se eras mais ou menos, eras o suficiente para mim.
Longe ou perto, o que é que isso interessa? Com amor ou sem amor, que importância tem isso? Estou aqui, de repente, já não estou, que diferença faz?
Mas interessou, foi importante e fez a diferença.
A dualidade continua em mim. Tinha dias em que gostava de pensar que estavas mal com a minha ausência, com este arrancar de penso instantâneo. Outros em que desejava que não passasses pelo mau bocado que passei sempre que tinha dias em que me custava mais não estares por perto. Já te odiei, mas também já te amei tanto. Já te mandei para um sítio obsceno, mas também já gritei para que voltasses para mim.
Já pensei "Não custa voltar a tentar" e agora só penso "Tenho de aceitar".
Não vou mentir. Há dias em que a esperança ainda me cumprimenta, vem e fica alojada no peito. Há dias em que eu penso que seria muito fácil esbarrar em ti, ainda mais agora que estamos a ladeiras de distância.
Mas há um dogma na minha vida: se tiver de acontecer, acontece. Portanto, se eu tiver de te ver, vou ver e não vou ter que fazer nada para isso. Nem o teu ponto final abstrato te adianta se um encontro for o que nos espera.
Estou serena, sabes? Satisfeita por conseguir cumprir o que me pediste - "deixa-me em paz".  Tranquila comigo mesma por não te culpar tanto por tudo isto, por entender que há coisas que não há volta a dar e que por muito que a gente puxe e tente agarrá-las, elas vão na mesma embora. Só porque é esse o seu caminho.
Mas não estou a conseguir dormir e lembrei-me dos dois quadrados de chocolate.

Lembrei-me de ti.


A Autora,
Aquilo que sou para ti

28 de agosto de 2018

Crónicas da Miúda Cá de Casa

19 anos e descomprometida - o fim dos mitos
Este título quase que sugere um assunto diferente daquele que realmente vai estar nas próximas linhas. Quase como se em vez de lermos o 19, soasse como se lá estivesse um 40. Ora bem, não está não, é mesmo um 19. A diferença é que isto não é um queixume. É só um testemunho e uma desmistificação.
Sim, sim, oh meu Deus, os teenagers e as suas hormonas. Vamos parar já aí. Às vezes, não são as hormonas que querem, é só o coração. Sim, malta! Incrível, não é? Também temos um órgão desses. Espetacular!
A seguir, mas nunca tiveste um namorado? Aposto que tens filas deles atrás de ti! Basta escolheres um. Oh minha gente! Primeiro, nem toda a gente tem filas e resmas, paletes de gente atrás de si. E quê? Eu até agradeço, menos momentos constrangedores de “desculpa, não te sintas magoado/a, mas eu não sinto isso por ti!”. É verdade. E isso não faz de mim pouco interessante. Não faz de nós pessoas menos interessantes ou menos boas de amar. Ainda assim, mesmo que se tenham filas, resmas, paletes de gente, não esperem que nós façamos uma seleção como se estivéssemos a escolher algo tão vulgar como um par de meias. Hoje quero estas, amanhã quero aquelas, daqui a uma semana, já usei outras três!
Aos avós que dizem, ai filha/o, também não é em casa que eles/as te aparecem e se não tens é porque não os/as procuras. A melhor de todas. Primeiro, é possível um jovem existir, ter coração e hormonas e, mesmo assim, não andar à procura de nada. Segundo, essa “procura” não funciona bem como procurar um emprego no jornal, sublinhando potenciais candidatos, muito menos funciona como se nós fôssemos um produto que tem de ser apregoado. Não é como vender fruta fresca no mercado, okay? Okay. (Viram o que fiz aqui? Digam que sim.)
A nós próprios, malta, às vezes dizemos coisas piores que o resto das pessoas todas juntas. Vamos parar com o “ai, queria tanto alguém”? Eu incluída. Vamos sim. O nosso querer aqui não tem muito voto na matéria. Quanto muito dizemos não quero isto, quero aquilo. Sim, claro. Mas o mais certo é chegar de rompante e, pumba, aqui estamos nós caídos e apaixonadamente irritantes.
Deixem-se ser lamechas, mesmo que não gostem. Sejam muito lamechas. Mas não demasiado. Vamos lá ver a conversa. Aqui ninguém aguenta escorregar em mel. Mais que tudo, não pressionem com futuros, não destruam com expetativas, não iludam quem vos ama e nem se deixem iludir por quem um dia disse que vos amou. O Fim, não é o fim do mundo, é o início de outro.
O coração passa por aquilo que tiver que passar.

 A Autora, 
A Miúda Cá de Casa


(Meus queridos, a Miúda Cá de Casa é irreverente, um bocadinho sem papas na língua e gosta de misturar humor com assuntos sérios, mas não é por isso que leva na brincadeira assuntos que são considerados importantes. Só gosta de acabar com mitos, de relaxar as pessoas e de as ajudar a ver as coisas com mais leviandade. Quando ela aparece, gosto de a deixar fluir. Não pretende ofender, muito menos meter todos dentro do mesmo saco, por isso, destapem as cabeças porque o barrete não serve a todos. <3)

11 de julho de 2018

Desapaixonar.


Sabes que existo? Eu sei que sabes. Mas sabes mesmo?
Estás diferente. Mais sereno. Mais bonito, tão cheio de luz, de sorrisos rasgados. Há qualquer coisa que mudou em ti. Ou será que foi em mim? Quando nos apaixonamos vemos as pessoas de forma diferente? Talvez.
Não gosto de ti. Mas estou tão apaixonada. Hoje e agora. Amanhã posso já não estar. Já perdi a conta às vezes que me apaixonei e desapaixonei de ti.
Deixa-me falar-te de mim. Deixa-me explicar o que me causas. A falta de sono, o coração que parece não saber trabalhar e a paz que me dás. Basta olhar contra olhar e tudo à volta se desfoca, tudo em mim se enaltece. Vejo-te melhor.
Tudo em mim se agita e pede por ti. Quem me dera ter-te olhado nos olhos logo da primeira vez. Quem me dera ter perdido a vergonha só para ter mais uns segundos de ti, desse oceano interior que guardas dentro do peito.
És um caminho perigoso e eu já caí tantas vezes nele. Espero um dia que me agarres. Queria sentir-te a pele. O aperto dos braços. Parar de me desapaixonar e sentir que podia ficar apaixonada para sempre. Que sim. Que era isto, aqui, agora, até ao fim. Mas não é. Nem sabes que estou apaixonada por ti. Não quero que saibas. Estar apaixonado pode fazer-se sozinho. Gostar implica o profundo desejo de que haja alguém para além de nós. E não há.
Pronto, já me desapaixonei.
Raios, já me apaixonei outra vez.
A autora, 
Nem ela própria sabe.


Lost in love and I don't know much
Was I thinking aloud and fell out of touch?
But I'm back on my feet and eager to be what you wanted

9 de maio de 2018

Crónicas da Miúda Cá de Casa


Conheço-me a mim mesma?
Será que existe algum momento na nossa vida em que nos vamos conhecer completamente?
Eu acreditava que sim. Ao longo das várias fases do meu crescimento, achava sempre que sabia o que era, aquilo que queria fazer e aquilo que queria ser. Mas como? Se o que sou hoje, já não é igual ao que fui ontem e não será igual ao que serei algures no futuro? Resumindo de forma pobre e muito rasca o meu percurso com base na minha vida profissional e (escassa dependendo do ponto de vista) vida amorosa, já quis ser astrónoma e já achei que ter um namorado, daqueles de escola primária, era a melhor coisa do mundo. Depois quis ser pediatra e achei que estava bem sozinha. Agora quero ser psicóloga e acredito que o amor não se resume à pessoa com quem partilhamos o coração, mas sim a todas aquelas fazem parte da nossa vida. E que por vezes quando achamos que as alturas são as certas, os momentos não são. É preciso bater com a cabeça e esfolar os joelhos, rebentar com os nós dos dedos, enquanto escavamos mais fundo, no fundinho de nós, para sabermos quem somos.
Eu pensava que me conhecia o suficiente para achar que iria responder à pergunta que foi feita. Qualquer coisa sobre o Piaget. Mas aqui estou eu a ignorar essa parte, só porque as perguntas retóricas puxaram mais por mim.
Se é para sermos sinceros e falarmos com o coração na boca, então mais vale confessar já uma coisa: todos achamos que sabemos exatamente quem somos. Mas a verdade é que não sabemos. Fazemos parte do Universo e, tal como não conseguimos contar todas as estrelas do céu, também não conhecemos a infinitude daquilo que somos.
Somos feitos do nosso passado. Quer ele tenha sido bom ou mau, fez de nós aquilo que somos. Somos seres que vivem o presente. Muitas vezes caímos no erro de o viver a pensar no futuro, é certo, mas faz parte da natureza humana. Ansiar o futuro, idealizá-lo, exigi-lo agora ou simplesmente não ter nenhuma esperança nele.
Mas aí é que está a beleza daquilo que somos. Acreditar que sabemos quem somos, faz-nos agir, faz-nos deixar marcas, boas ou más, talvez apenas menos boas. O que é o mau? (Esta fica para outra altura.)
Acreditar que conhecemos cada pedacinho de nós dá-nos confiança, permite-nos criar uma identidade mesmo que a tenhamos que configurar de vez em quando.
Talvez isso seja conhecermo-nos a nós mesmos. Conhecer enquanto verbo e ação que ainda não teve um fim e não como um dogma, algo parecido com uma regra definitiva que tem de ser intrínseca em nós.
Eu não me conheço. Eu vou-me conhecendo.
Talvez esta seja a minha verdade.
A autora,
A Miúda Cá de Casa